Capítulo 2

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2.5.2 -  Percepções e Inferências

Seja como premissa, como confirmação ou reforço de uma conclusão, a hipotipose é uma figura 

claramente perceptiva, isto é, as- senta no testemunho (imaginado) dos senti- dos. O que o orador 
intenta com a hipotipose é que o ouvinte se convença tal como aconteceria com uma percepção 
direta do que é assim descrito. Ora o que caracteriza a percepção, em termos de convencimento, é o 
ser direta. Quem vê e ouve não reflete o que vê e ouve. Aqui a força do convencimento é a força do 
que entra pelos olhos dentro.

Em retórica, ao contrário da lógica, é mais fácil acreditar no que diretamente se vê ou percepciona 

do que no que fica demonstrado numa rigorosa cadeia inferencial ou argumentativa.  Na percepção, 
e na hipotipose, não é necessário esforço, as coisas oferecem- se ao olhar, ao passo que num processo 
inferencial há que permanentemente aferir as conclusões e os passos da conclusão relativamente às 
premissas e regras de inferência, o que, não raras vezes, exige um grande es- forço intelectual.

A expressão “ver para acreditar”, ou a sua variante “não há como ver para acreditar” traduz bem a 

primazia do direto sobre o indireto, no que ao convencimento diz respeito.  O que é direto é evidente 
por si e, portanto, basta-se, enquanto o que é indireto é insuficiente, tem de recorrer sempre ao direto, 
nomeadamente às premissas da argumentação.

2.5.3 - O Geral e o Particular ou o Abstrato e o Concreto

De algum modo associado à distinção entre o que é do domínio da percepção e do da inferência, 

está a distinção entre o geral e o particular ou entre o abstrato e o concreto. Tudo o que é percepcionado, 
aquilo que, em termos retóricos, entra pelos olhos dentro, é particular e concreto. O que é dado aos 
senti- dos é aquilo e não outro, é algo determinado, concreto e definido.

Ora para convencer há que descer ao particular e ser concreto. Os ouvintes precisam de sentir, e não 

apenas de entender, a verdade ou a justeza daquilo que se lhes pretende transmitir na peça retórica.  
Para isso nada melhor do que um caso real, um exemplo ou uma fábula.  Aqui encontramo-nos no 
âmbito do particular e concreto. É sabido que o livro de Harriet Elizabeth Stowe, A Cabana do Pai Tomás, 
teve uma influência decisiva no sentimento popular norte-americano contra a escravatura e que, por 
isso, é apontado como uma das causas da guerra civil americana. Para convencer um povo da injustiça 
da escravatura, uma boa história vale mais do que um tratado filosófico sobre a igualdade humana.

No convencimento o apelo às emoções é tão ou mais forte, consoante as circunstâncias, que o 

apelo à razão. E aí jogam os casos e não as ideias.  Para convencer um pai ou uma mãe que, por 
tradição e cultura, tiram os filhos da escola para os pôr a trabalhar e, assim, os integrar logo cedo na 
economia familiar, não bastam discursos racionais, há que saber ‘pintar’ o futuro negro que a baixa 
escolarização acarreta e, simultaneamente ‘pintar’ o futuro risonho de uma escolaridade completa.  E 
aqui ‘pintar’ significa ser concreto, expor esta e aquela possibilidade.

A supremacia da propaganda britânica sobre a germânica, durante a Primeira Guerra Mundial, 

residiu, segundo Armand Mattelart, no facto de ser muito mais concreta e emocional. “Enquanto 
Londres emitia notícias anunciando as atrocidades cometi- das pela soldadesca inimiga, com 
fotografias mostrando-a em pilhagem, etc., Berlim lançava-se em longas dissertações, demonstrando 
que só o interesse do Reino Unido em liquidar a indústria do seu concorrente tinha justificado a 
guerra, explicando com profundos detalhes as razões históricas e diplomáticas da política de cerco 
da Alemanha por parte de Eduardo VII. ”

2.5.4 - A força das imagens

A força retórica das imagens advém-lhes de serem particulares e concretas. Não há uma imagem 

do homem em geral, mas deste ou daquele homem, bem concreto e definido. Enquanto as palavras 
designam (na linguagem de Kant) conceitos, representações gerais, as imagens são de cariz intuitivo, 
e, por- tanto, representações particulares.   Tudo o que é real é determinado, particular e concreto.  
Um homem real é um ser com de- terminadas características, com uma fisionomia própria e outras 
particularidades únicas. Ora a imagem é sempre a imagem de alguma coisa, com uma forma 
determinada, a imagem de algo concreto. As palavras são sempre da ordem do geral, referem-se 
a classes de objetos e o seu significado é de natureza ideal. A palavra “homem”, significando ser 
humano, tanto pode referir-se a um homem como a uma mulher, a um jovem como a um idoso, a um 
branco como a um negro, a um baixo como a um alto, a um gordo como um magro.  Trata-se de uma 
representação geral, abstrata.